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Presidente Luis Inácio;
Sou um cidadão comum que assiste os fatos politicos deste país, e, com eles, me assusto.
Estou me referindo ao episódio Cesare Battisti.
Acompanhei o julgamento do STF, mas não tenho conhecimento jurídico para decifrar o processo em sua íntegra. Sou comum, como a imensa maioria dos brasileiros.
Entretanto, uma coisa importante me chamou a atenção: o placar. 5X4, sendo que o quinto voto foi o do Presidente do STF. Se ele se abstivesse da votação, como deveria ter feito, o resultado seria o empate.
Então, fico pensando: a lei deve ser clara. Por mais que se possa interpretar um texto legal, e a interpretação é uma das características das leis modernas, o resultado da votação do Supremo demonstra incerteza, falta de claridade ou, ainda, margem a dúvidas.
Repito. Sou um cidadão comum que se arrisca a comentar um ato jurídico que foge do meu conhecimento. Mas tenho idade o bastante para criar meus juízos de valor; sou ético e capaz de discernir. Isso me dá a certeza de que algo está errado. O placar.
Leio em parte da imprensa hipócrita e comprometida, tanto a brasileira quanto a italiana, comentários a respeito de Battisti. Tratam-no de terrorista! Nós sabemos que os crimes que ele cometeu, se é que os cometeu, são de ordem politica. Até na Itália ele é considerado ativista politico mas, paradoxalmente, em pleno período de turbulência naquele país, foi condenado como criminoso comum.
Isso é mentiroso, indecente, calunioso (porque ofende os ideais de Battisti e de outros milhões de ativistas), baixo e, sobretudo, imoral! Não fosse, o placar teria sido 9X0 !
Senhor Presidente, milhões de brasileiros o admiram como chefe de Estado e como homem; como lider sindical e promotor de profundas mudanças na vida social do Brasil. Sei que suas responsabilidades vão além de extraditar ou não; que as consequências diplomáticas devem pesar num momento desses. Mas, por conhecer sua trajetória politica, sei que o senhor tomará a melhor decisão no caso Battisti.
Comecei esta carta falando dos sustos. Me assusta quando a politica se mistura ao Judiciário. É o que está acontecendo agora, no caso Battisti, quando Ministros do Supremo agem conforme suas preferências político-partidária diante de uma caso sério, que trata da vida de um homem que teria cometido um crime há mais de 30 anos atrás … então fico pensando em quantas vezes na história deste país já não disseram que o lider sindical Luis Inácio, operário-barbudo-comunista, era baderneiro, agitador, leninista, perigoso …
O placar, senhor Presidente. O placar mostra o quanto frágil foi a decisão do STF.
Agora, a justiça em suas mãos. O senhor é o único brasileiro que pode decidir o futuro do ativista Cesare Battisti. Devolvê-lo ao fascista Berlusconi – aquele das orgias que tentou aprovar uma lei que o inocenta de seus crimes – será como decretar a morte de Battisti. Não a morte física, pois esta ele já a arriscava durante os anos negros na Itália repressora. Mas a morte do ideal, do sonho.
Certamente o mesmo ideal, o mesmo sonho, que eu tinha quando jovem – e que ainda tenho – que é mais justiça social e menor controle das oligarquias conservadoras sobre o desenvolvimento de uma Nação. O sonho de liberdade, de igualdade perante a lei. Para todos.
Tenho certeza, Presidente Lula, que estes são seus sonhos também.
Para terminar, quero fazer um breve comentário a respeito do simbolo da Justiça.
Na Grécia antiga, a deusa Diké, filha de Zeus e Thémis, segurava numa das mãos uma balança (igualdade) e, na outra, uma espada (força). Ela foi considerada o simbolo da Justiça porque a força é um elemento inseparável da igualdade.
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A balança sem a espada é a impotência do Direito.” (Rudolf Von Ihering)
Battisti pode ter cometido crimes ao usar a força. Condená-lo a perder seus sonhos, entretanto, é ainda mais cruel.
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